Machismo na minha sala de aula, NAO!

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“Tia Zeli, o _____ chegou em casa me contando que os coleguinhas estão chamando ele de mulher. Poderia olhar isso, por favor?” (SIC)

Recebi um bilhetinho ontem, com esta pergunta, na agendinha de um aluno e eu li e reli várias vezes essas poucas linhas. Peguei a caneta e tentei,  pela manhã, responder ao questionamento tão “simples”. Acontece que não conseguia. Não saia uma palavra por que o que se esperava de mim naquela hora era o oposto do que eu queria escrever. Minha vontade era escrever uma carta imensa, gigantesca, mostrando pra essa mãe que chamar alguém de mulher não é xingar essa pessoa. Quer ser mulher é a coisa mais maravilhosa do mundo e que ela estava sendo machista. Perguntaria e ela também se seu medo seria seu filho “virar” gay ou se tornar afeminado só de ouvir alguém chamá-lo assim. Coisa que já ouvi tantas vezes de outros pais e mães.

Nessa hora, com o coração acelerado (eu fico assim, nervosa, quando leio coisas absurdas. Fico tão alarmada, com a adrenalina no pico, tal qual ficamos quando ameaçados fisicamente.) me lembrei de outra conversa tida meses atrás com outra mãe sobre homossexualidade. Um aluninho contou a história de um primo que namorava um rapaz em uma rodinha de conversas que fazemos toda segunda feira. O outro, que ouviu a história, falou assim: “Credo. Homem só namora com mulher. Não é, tia? E eu respondi: “Não. Homens namoram homens também. Assim como algumas mulheres namoram com mulheres”. Ele me olhou no fundo dos olhos e disse: “ Não é não. Que nojo.”. Daí foram brincar e eu deixei pra lá. No outro dia, na sua vinda pra escola, uma das cuidadoras foi pegá-lo no portão e ele não queria entrar a menos que a mãe dissesse que HOMENS SÓ PODERIAM NAMORAR MULHERES. QUE O CONTRARIO É NOJENTO. E a mãe repetiu palavra por palavra.

O recado chegou a mim e eu fiquei roxa na hora. Repensei minha carreira, minha profissão. Lembrei-me do meu professor de filosofia da faculdade dizendo que todo professor também é professor de moral. Que a aceitação e respeito às diferenças se dá, sobretudo, na escola…

Pensei. “Que merda!! Pra que passei 4 anos na faculdade, morri de ler mil textos, passei noites na frente do computador escrevendo e pesquisando pra ser a melhor professora possível pros meus alunos, pra guiá-los por novos caminhos e fazer deles pessoas de bem se a família trabalha na contramão?” Chorei nessa hora!!

Por que será tão difícil pras pessoas entenderem que devemos respeitar a escolha dos outros? Que a vida do outro interessa somente a ele? Que você amar alguém igual a você não é nojento? Que é lindo e sublime? Que não amar e respeitar os outros, isso sim é nojento e imoral? Que alguém ser chamado de mulher é uma honra e não um xingamento? Por quê? Falta de amor fraterno. Nada além disso!

Eu tento me calar às vezes, por que cansa e dói muito você ficar dando murro em ponta de faca, mas quando eu me lembro das várias mulheres que tiveram que dar a cara à tapa, ficarem presas e até torturadas e mortas pra que eu pudesse sair de casa pra trabalhar, eu renovo meu ânimo. E enquanto eu tiver voz e forças e puder lutar contra o machismo, a homofobia e todas as formas de violência e segregação eu o farei.

Ainda que meus únicos campos de batalha sejam a minha casa e a sala de aula.

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